O Incêndio

– “Ao convento! ao convento!” – Uiva de longe o vento.

É noite. E a multidão, descalça, esfomeada,

à luz de archotes, sobe a ladeira empedrada,

praguejando e gritando: – “Ao convento! ao convento!”

A onda do povo cresce e galga num momento.

Chispam ferros no ar. A porta, chapeada

de bronze, range, oscila e cai à machadada.

Nem um frade. Deserta a casa de S. Bento.

A multidão convulsa invade a portaria:

– “Fogo ao convento! fogo à igreja, à sacristia!”

O incêndio lavra, estoira o vigamento a arder.

Em baixo, o povo dança. E uma mulher grosseira

grita, rouca, atirando um Missal à fogueira:

– “Tanto livro, e ninguém nos ensinou a ler”!

Júlio Dantas

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