O Príncipe Real é um projecto do coração

Anthony Lanier em entrevista ao Expresso de 21-07-2008, conduzida por Fernanda Pedro

“O Príncipe Real é um projecto de coração”

Todos o conhecem como o americano que chegou a Portugal e comprou quase todos os antigos palácios e palacetes do Príncipe Real, para transformar aquele local num bairro de “charme” em Lisboa. Trata-se de um projecto que irá ajudar a requalificar a capital portuguesa.
O Expresso entrevistou o homem que está disposto a levar em frente essa cruzada e descobriu que não é americano, mas sim austríaco, nascido no Rio de Janeiro, Brasil, e casado com uma portuguesa. Anthony Lanier é presidente da EastBanc e revela as suas intenções no mercado imobiliário português. Até agora, investiu cerca de 50 milhões de euros na aquisição de edifícios no Príncipe Real, mas não vai ficar por aqui.
Porque decidiu trabalhar no sector imobiliário?
No momento estou a trabalhar no sector dos imóveis, como investidor. Tenho a oportunidade de fazer projectos pelo mundo e o investimento imobiliário pode permitir fazer mecenato. E os nossos artistas são os arquitectos. Adoro fazer o melhor edifício que posso imaginar. Claro que estamos a trabalhar para fazer dinheiro, o lucro faz parte do processo, mas não é a primeira ideia. Para fazer mais lucro vou para Wall Street comprar e vender acções, ou especular as minhas ideias. Já fiz bastante dinheiro na minha vida e gostaria de fazer uma coisa diferente nesta cidade, que adoro. Conheço-a há 30 anos e acho que tem uma alma sem paralelo.
Porquê o Príncipe Real?
Foi uma coincidência. Queria fazer uma coisa nesta cidade. Estudei bem o mercado, como se fazem os negócios em Portugal, sei as dificuldades que vou ter e sei naturalmente que as pessoas vão ter de fazer progressos. Queria arranjar uma oportunidade e, por acaso, foi este o primeiro edifício (Rua da Escola Politécnica, nº 38) que encontrei. Estava a pensar nas zonas da Baixa e da Lapa, mas encontrei este edifício e comecei a pensar no Príncipe Real. E no fim dos meus pensamentos, concluí que este local é o centro da cidade. É um lugar fantástico, e todos os locais especiais de Lisboa têm de ter uma vista sobre a cidade. Quando me chego a uma janela, quero saber se estou em Istambul, Manhattan ou Lisboa. E o Príncipe Real tem vistas sensacionais sobre a cidade, sobre o Tejo. Mas tão importante como as vistas é a proximidade para o negócio. Posso andar 25 minutos a pé e estou na Avenida da Liberdade, sete minutos e estou na zona do comércio do Chiado. Posso andar a pé, não preciso de carro. Um dos privilégios que temos na vida é não andar com o carro mas sim a pé para o escritório, restaurante, cinema, compras. Gosto do sentimento da vila, deum bairro. E o Príncipe Real tem a possibilidade de ser um bairro internacional com acesso a todos os negócios e perto de tudo, o que é importante para se viver bem numa cidade. Por isso adoro esta zona.
Quantos edifícios já adquiriu neste local?
Já não sei quantos edifícios temos. Há muitos pequenos e outros maiores, mas vamos dizer, entre 10 e 20. Vamos continuar a comprar edifícios, se conseguir comprá-los a um preço que se adeqúe a uma recuperação. Porque temos de os adaptar aos tempos modernos, ao século XXI. EmWashington começámos um projecto parecido e temos cerca de 60 edifícios. Aqui também vamos ficar com omesmo tamanho. Vamos ver como vai ficar o “masterplan” da zona do Príncipe Real à Avenida da Liberdade, quem vai ganhar, como será a solução para esta zona, e depois vemos quantos edifícios arranjaremos neste processo.
Significa que quer transformar esta zona num bairro de charme?
É uma das zonas mais velhas da cidade. Já o Marquês de Pombal adorou esta zona e por isso lhe chamou de Príncipe Real. Queremos não lhe retirar esse charme, o sentimento deste bairro tem de se manter e até melhorar, trazendo-lhe mais vida, mais lojas. Estas têm de ganhar dinheiro, as pessoas têm de entrar mais e andar mais a pé. Todos os edifícios que comprámos aqui estavam vazios.
Tem existido uma abertura por parte da Câmara Municipal de Lisboa para que também recupere os espaços públicos exteriores?
Acho que sim. Por isso a Câmara pediu aos arquitectos para arranjarem ideias para mudar ou recuperar esta zona. Eles têm uma grande vontade de avançar aqui e vamos ver se conseguem introduzir as ideias no “masterplan” e fazer uma coisa melhor do que está agora.
Está a trabalhar com arquitectos portugueses como o Souto Moura. Em que medida é importante ter alguém como ele para o sucesso do seu projecto?
Tenho a oportunidade de trabalhar com bons artistas. E para começar era mais fácil um arquitecto que tivesse um nome fora do país, principalmente quando pretendemos fazer um novo estilo de edifício e de vida, ajuda na nossa credibilidade. Assim, temos um arquitecto que tem a posição certa no país. E entendi- me muito bem com ele. Souto Moura é um arquitecto muito sensível para recuperar os edifícios e não destruir. Ele adorou a ideia e ficou cheio de vontade de nos ajudar a modificar estes edifícios.
Que investimento foi feito até agora?
Cerca de 50 milhões de euros.
E quanto pensa investir ainda?
Centenas de milhões de euros. É um projecto que vai durar até ao resto da minha vida. Porque não é um projecto para se começar num dia e acabar no outro. Nós vamos fazer edifícios emodificá-los, e isso vai durar entre 10 e 15 anos. Vai demorar muito tempo e vão ser aplicados cerca de 250 milhões de euros nos próximos dez anos aqui. Parece muito mas não é muito. Depois de ver investido sente-se melhor, mas não é uma diferença enorme.
Que desafio constitui para si este projecto?
Vim da Áustria, e apesar de ter nascido no Rio de Janeiro, no Brasil, aminha formação foi feita em terras austríacas. Durante algum tempo fiquei numa vila de ski e em Viena. Esta é uma cidade com muito charme e com um centro da cidade que é único. O que gostei muito na Áustria foi o tempo. As pessoas tinham tempo para passear e iam para o centro da cidade para fazerem compras e conversar com os amigos. Assim, umbairro pode funcionar e podemos fazer de Lisboa um local onde as pessoas gostem de viver e ficar aqui. Tenho tempo, vou para o Príncipe Real sentar-me no café ou fazer compras.
E será para transformar em habitação?
Sim, é para trazer as pessoas de volta. Para usarem estes jardins. Ninguém conhece estes jardins e depois de recuperá-los todos podem usá-los.
E pensa investir fora desta zona?
Temos uns investimentos fora do Príncipe Real, e mesmo fora de Lisboa, mas agora concentrámo- nos nesta zona. Tem pouco interesse em ir para a Baixa, Castelo ou Rato. Quero ficar a 10 minutos a pé deste lugar.
O que tem Lisboa para oferecer, quais as suas potencialidades?
Lisboa podia ser o ‘umbigo de prazer’ da Europa. Tem uma situação única, porque dois continentes têm acesso à Europa por Lisboa. Infelizmente as pessoas não param. Os brasileiros gostam de chegar por Lisboa porque aqui se fala a língua deles. Tal como os americanos preferem entrar na Europa por Londres. Também bastantes pessoas que vêm de África preferem entrar pela capital portuguesa. As pessoas hoje querem viver bem e Lisboa não está a agarrá-las-e o primeiro e o último dinheiro a gastarem quando chegam ou quando regressam às suas terras tem de ser aqui. Entretanto, deixam o dinheiro em França ou em Londres. Lisboa tem capacidade, a habilidade de vender qualidade de vida, o charme, e não vende.
Quais as maiores dificuldades sentidas em investir em Lisboa?
A opinião das pessoas. Todas pensam que cada coisa que vamos fazer vai piorar a cidade. Então ninguém faz nada. Estamos a olhar para Lisboa com sentido de negócio há dez anos. Os projectos são os mesmos, não avançaram, os preços são os mesmos para os edifícios, as pessoas ainda não venderam, tudo está parado porque as pessoas não acreditam no progresso e não são abertas para isso. Se uma acredita, cinco têm dúvidas sobre o que vai ou pode acontecer. Isto é um trauma que elas têm.
Essa crítica também pode ser dirigida aos órgãos de decisão e à dificuldade burocrática na concretização dos projectos?
Também nos outros países. Em Washington DC também existe uma administração enorme, difícil, pesada, lenta, mas geralmente as pessoas que trabalham na administração querem ajudar, não são inimigas dos que querem fazer negócio. Aqui não há uma regra – queria abrir uma conta bancária e cada um tem uma regra diferente. Se não há regras criam-nas, mas a administração agora está a simplificá-las e a acelerar o processo, e isso é muito importante para o sucesso de Lisboa. Se antes viajasse para o Dubai encontrava um deserto e durante a nossa conversa eles conseguiam construir uma cidade. A simplicidade de fazer negócio. E venho de um país de negócios onde tudo é rápido e simples, mas no Dubai nunca vi nada igual. Em cinco anos mudam uma cidade, e nós não conseguimos uma licença de construção.
Além de simplificar, o que é necessário mudar mais em Portugal?
Precisamos de um aeroporto moderno do século XXI. Temos de mostrar às pessoas que quando aqui vêm têm muitas coisas para visitar. Este país podia ser uma Toscana onde saíssemos do aeroporto para todo o país. Temos de ter mais hotéis agradáveis, sensacionais, com mais qualidade. Temos de arranjar para Portugal uma economia. As pessoas não podem gastar dinheiro – se não ganham não podem gastar. A única economia de Portugal são os serviços.
Por que razão os investidores estrangeiros apostam em Portugal?
É muito difícil encontrar um investidor estrangeiro, sem ser brasileiro que está aqui a comprar por um sentimento. Há tantas oportunidades de investir dinheiro noutros países. Quem investe aqui é porque gosta de ver o investimento aqui.
É então um investimento com base no sentimento?
Claro, completamente pelo sentimento. Se não fosse, não investia aqui.
Fora de Portugal, onde já investiu?
Temos um escritório na Rússia, na Sibéria, onde vamos fazer o primeiro projecto no próximo ano. Mas na Sibéria temos negócios de “software”, e daí termos um escritório com cerca de 70 pessoas. Depois em Portugal, nos Estados Unidos da América e, brevemente, vamos abrir um escritório no Brasil. E ainda vamos para mais países.
Mas o projecto do Príncipe Real é o do coração?
O de Lisboa é o do coração, o da Rússia é a loucura da vida, uma aventura, e o dos Estados Unidos da América é um negócio.
Daqui a 10 anos o que gostava de ver em Lisboa?
Gostava de fazer mais Príncipes Reais. Se conseguir a construção para o ano que vem, quando daqui a dez anos sair pela porta de casa vou ver mais pessoas nas ruas, mais pessoas felizes aqui no local e que Lisboa é umsítio óptimo para viver. Com o arquitecto Souto Moura e todos os outros que vamos empregar no futuro e que o arquitecto nos vai ajudar a encontrar, tudo vai ser diferente. Se fizermos isso, em cinco anos todos vão falar de Lisboa e será um projecto conhecido fora do país.
Como chegou a Portugal e a que se deve esta paixão?
Sou da Áustria e muitos amigos da família tinham casa em Portugal. Depois nós também comprámos uma, quando tinha cerca de 15 anos. Por isso, encontrei aminha mulher aqui em Portugal e fui regressando. E pensei num jeito de fazer negócio aqui. Assim posso ficar mais tempo e a minha mulher não vai fugir.
Quer dizer, apaixonou-se por um portuguesa e pela cidade…
É verdade, tudo começa sempre com as mulheres.
    • Cristina Moura
    • 3 de Novembro, 2009

    Desabafo.

    António,como sabe vivo na Margem Sul,na Caparica há 12 anos.
    Vim para cá com uma mala cheia de sonhos,muitos dos quais se concretizaram!
    Para quem viveu sempre em Lisboa,como eu,foi entrar nun universo totalmente desconhecido.
    Pessoas simples que me acolheram de uma forma tão calorosa!
    De facto esta casa tem uma situação previlegiada.que não é fácil encontrar.
    Com o passar dos anos,comecei a sentir um certo isolamento.a falta dos amigos porque não há dúvida,a ponte é um entrave,as intermináveis filas,o ter que pegar no carro para comprar um livro,um tinteiro e o que quer que seja que não sejam alimentos!
    Há cerca de um ano,começei a pensar sériamente em regressar a Lisboa.Pensei no Chiado e Principe Real.Porque quero uma janela aberta sobre a cidade,quero estar no coração desta cidade linda que é Lisboa.Não tirar o carro para ir trabalhar,nem para jantar,nem para comprar algum livro,nem ter que percorrer cerca de vinte e tais kms para estar com os amigos,ou vice versa.Custa-me deixar o mar,muito.Adoro a casa que significa nuito para mim mas penso que vou reaver uma qualidade de vida que neste momento necessito,para além do convívio quotidiano com os meus amigos de toda uma vida que me faz muita falta.Sei que decisão é unicamente minha,mas o que pensa?

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