Arquivo de 19 de Maio, 2004

blogus interruptus

Nos próximos dias não vou poder cumprir um dos rituais diários, o de visitar amigos na blogosfera.

Desde o início do ano tenho-me habituado aos posts, aos comentários e, aquilo que me tem dado mais prazer, a estabelecer cumplicidades!

Aos amigos que têm a gentileza de visitar o meu cantinho desejo uma boa semana, com um sorriso!

Meus amigos, desculpai-me

pois, inadvertidamente, vos iludi.

Bem sei agora que de mim

vós todos esperáveis um poeta completo,

alguém como um semideus

que conseguisse se embrenhar no segredo do cosmo,

capaz de sofrer a angústia do big-bang inicial

e de viver o gozo, supremo e espasmódico,

de algum astro recém-nascido.

Não, meus amigos.

Decididamente não sou eu o poeta que buscais.

Para desfazer qualquer dúvida que ainda remanesça,

permiti que vos diga, num rasgo de confessada humildade,

que eu jamais consegui decifrar o código de angústia

do riacho que, perdido, serpenteia pela floresta;

que eu, embora tenha me esforçado ao extremo,

ainda não traduzo fielmente a voz do vento andarilho,

mexeriqueiro bailarino a confabular com as árvores

os segredos trazidos de distantes paragens.

Tende em mente que minha sensibilidade

é suficiente apenas para entender

que a cor avermelhada da aurora

se deve ao sangue das paixões sublimadas.

É honesto dizer ainda que não tenho tido êxito

ao tentar compreender as conversas informais das estrelinhas

quando, nas noites frias de inverno,

se reúnem para tricotar suas nuvens de algodão.

Bem se vê que é indevido o vosso comportamento

quando, em contato com meus versos humildes,

vos dizeis maravilhados das palavras desconexas

que, presunçosamente, apelidei de poesia.

E, para melhor vos iludir,

fiz do meu verbo uma argamassa

composta de dores e amores,

de sonhos e prantos e sorrisos e lágrimas.

Porque – é forçoso reconhecer! –

este vosso amigo, longe de ser um poeta pleno,

ainda não conseguiu ir além do coração do homem.

Solange Rech