Archive for the ‘ Leituras ’ Category

MUDE de leituras

Feita para não passar despercebida, a revista/catálogo do novo Museu do Design e da Moda é visualmente atraente (a começar pela capa), mas é no interior que  nos rendemos ao conceito, um excelente tónico para contrariar o cinzentismo destes dias. Vale a pena dar uma espreitadela em algumas páginas, aqui

Feira do Livro

Feira do Livro de Lisboa

Este ano, a Feira do Livro começa mais cedo e decorre de 30 de Abril a 17 de Maio.
Parece que vai ser mais funcional. E bonita, digo eu!
Horário: 2ª a 5ª Feira, das 12h30 às 20h30 – 6ª e véspera de feriados, das 12h30 às 23h00
Sábados, das 11h00 às 23h00 – Domingo, das 11h00 às 22h00

Com este calendário, é preciso ser muito optimista em relação à metereologia! A hora de almoço parece-me bem, desde que não haja só farturas e algodão-doce para enganar o estômago, pois o fecho às 20:30 significa jantar mais tarde. Sugiro assim a seguinte campanha: a quem comprar um livro às 13:00 e outro às 20:00, é oferecido um jantar num dos tascos do Jardim Amália. Não sou esquisito!

25 de Abril – Páginas da História

Em 1974, tinha 13 anos. Lembro-me que lia os vespertinos Diário Popular e A Capital. Dois dias depois da Revolução, comprei a Edição Especial de O Século Ilustrado e retive, desde então, as palavras de alguém que estaria junto à banca dos jornais: “Guarda, que um dia vais mostrar aos teus netos”.
Embora esse dia ainda não tenha chegado, aqui fica o Documento, que está publicado na minha página do Issuu.

As reportagens fotográficas são de Eduardo Gageiro, Fernando Baião, Francisco Ferreira e  Afredo Cunha.

O Século Ilustrado - Suplemento ao Nº 1895, de 27 de Abril de 1974

 

Finest Hour

Seria o livro sobre Obama maçador?! O facto é que ele dormia o sono dos justos! 🙂

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Museu do Côa

Enquanto não é divulgada a data de inauguração do Museu de Arte e Arqueologia do Vale do Côa (atenção ao calendário, sr ministro da cultura, as eleições estão aí à porta), a esforçada equipa do PAVC vai puxando pela imaginação para atrair visitantes.
Duas notas ainda, para as obras em fase de acabamentos e para o lançamento do novo livro de António Martinho BaptistaO paradigma perdido: o Vale do Côa e a arte paleolítica de ar livre em Portugal.

 

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Foi você que pediu uma Depressão?

Return of Depression EconomicsO Regresso da Depressão Económica e a Crise Actual 

Paul Krugman – Editorial Presença, 2009

Sinopse: O Regresso da Economia da Depressão e a Crise Actual é a edição actualizada de um clássico da Economia, The Return of Depression Economics, da autoria de Paul Krugman, laureado com o Nobel da Economia em 2008. Nessa obra, publicada no ano de 1999, Krugman analisa a crise económica que assolou a Ásia e a América Latina e alerta para o facto de constituírem avisos à economia ocidental. Esta nova edição inclui reflexões sobre a crise actual e salienta o paralelo que é possível traçar entre ela e os acontecimentos que estiveram na origem da Grande Depressão. No seu estilo lúcido, claro e extremamente informativo, Krugman revela-nos de que forma a incapacidade dos reguladores para acompanhar as evoluções de um sistema financeiro cada vez mais incontrolável lançou os Estados Unidos e o mundo na maior crise financeira desde a década de 1930 e aponta as soluções indispensáveis para conter a crise e resgatar a economia mundial de uma recessão de resultados imprevisíveis.

 

Leituras recomendadas para entender o conceito “injectar liquidez no buraco”, este artigo de Pedro Carvalho e este de Jorge Braga de Macedo. Já agora, também a ressaca deste.

Sermão aos Peixes

Vós sois o sal da terra,Vos estis sal terrae. S. Mateus, V, l3.

         

    Vos quibus rector maris, atque terrae

    Ius dedit magnum necis, atque vitae;

    Ponite inflatos, tumidosque vultus;

    Quidquid a vobis minor extimescit,

    Maior hoc vobis dominus minatur.

     

    Notai, peixes, aquela definição de Deus: Rector maris atque terrae: «Governador do mar e da terra»; para que não duvideis que o mesmo estilo que Deus guarda com homens na terra, observa também convosco no mar. Necessário é logo que olheis por vós e que não façais pouco caso da doutrina que vos deu o grande Doutor da Igreja Santo Ambrósio, quando, falando convosco, disse: Cave nedum alium insequeris, incidas in validiorem: «Guarde-se o peixe que persegue o mais fraco para o comer, não se ache na boca do mais forte», que o engula a ele. Nós o vemos aqui cada dia. Vai o xaréu correndo atrás do bagre, como o cão após a lebre, e não vê o cego que lhe vem nas costas o tubarão com quatro ordens de dentes, que o há-de engolir de um bocado. E o que com maior elegância vos disse também Santo Agostinho: Praedo minoris fit praeda maioris. Mas não bastam, peixes, estes exemplos para que acabe de se persuadir a vossa gula, que a mesma crueldade que usais com os pequenos tem já aparelhado o castigo na voracidade dos grandes?

 

in Sermão de Santo António aos Peixes – capítulo IV, de Padre António Vieira

se ao menos conseguisse dormir…

Gustav Klimt – Death and Life, 1916

O relógio que está lá para trás, na casa deserta, porque todos dormem,deixa cair lentamente o quádruplo som claro das quatro horas de quando é noite.
Não dormi ainda, nem espero dormir. Sem que nada me detenha a atenção, e assim não durma, ou me pese no corpo, e por isso não sossegue, jazo na sombra, que o luar vago dos candeeiros da rua torna ainda mais desacompanhada, o silêncio amortecido do meu corpo estranho.
Nem sei pensar, do sono que tenho; nem sei sentir, do sono que não consigo ter.
Tudo em meu torno é o universo nu, abstracto, feito de negações nocturnas.
Divido-me em cansado e inquieto, e chego a tocar com a sensação do corpo um conhecimento metafisico do mistério das coisas.
Por vezes amolece-se-me a alma, e então os pormenores sem forma da vida quotidiana bóiam-se-me à superfície da consciência, e estou fazendo lançamentos à tona de não poder dormir. Outras vezes, acordo de dentro do meio-sono em que estagnei, e imagens vagas, de um colorido poético e involuntário, deixam escorrer pela minha desatenção o seu espectáculo sem ruídos. Não tenho os olhos inteiramente cerrados. Orla-me a vista frouxa uma luz que vem de longe; são os candeeiros públicos acesos lá em baixo, nos confins abandonados da rua.
Cessar, dormir, substituir esta consciência intervalada por melhores coisas melancólicas ditas em segredo ao que me desconhecesse!… Cessar, passar fluido e ribeirinho, fluxo e refluxo de um mar vasto, em costas visíveis na noite em que verdadeiramente se dormisse!… Cessar, ser incógnito e externo, movimento de ramos em áleas afastadas, ténue cair de folhas, conhecido no som mais que na queda, mar alto fino dos repuxos ao longe, e todo o indefinido dos parques na noite, perdidos entre emaranhamentos contínuos, labirintos naturais da treva!…
Cessar, acabar finalmente, mas com uma sobrevivência translata, ser a página de um livro, a madeixa de um cabelo solto, o oscilar da trepadeira ao pé da janela entreaberta, os passos sem importância no cascalho fino da curva, o último fumo alto da aldeia que adormece, o esquecimento do chicote do carroceiro à beira matutina do caminho… O absurdo, a confusão, o apagamento – tudo que não fosse a vida… E durmo, a meu modo, sem sono nem repouso, esta vida vegetativa da suposição, e sob as minhas pálpebras sem sossego paira, como a espuma quieta de um mar sujo, o reflexo longínquo dos candeeiros mudos da rua.
Durmo e desdurmo.
Do outro lado de mim, lá para trás de onde jazo, o silêncio da casa toca no infinito. Oiço cair o tempo, gota a gota, e nenhuma gota que cai se ouve cair.
Oprime-me fisicamente o coração físico a memória, reduzida a nada, de tudo quanto foi ou fui. Sinto a cabeça materialmente colocada na almofada em que a tenho fazendo vale. A pele da fronha tem com a minha pele um contacto de gente na sombra. A própria orelha, sobre a qual me encosto, grava-se-me matematicamente contra o cérebro. Pestanejo de cansaço, e as minhas pestanas fazem um som pequeníssimo, inaudível, na brancura sensível da almofada erguida. Respiro, suspirando, e a minha respiração acontece – não é minha. Sofro sem sentir nem pensar. O relógio da casa, lugar certo lá ao fundo das coisas, soa a meia hora seca e nula. Tudo é tanto, tudo é tão fundo, tudo é tão negro e tão frio!
Passo tempos, passo silêncios, mundos sem forma passam por mim.
Subitamente, como uma criança do Mistério, um galo canta sem saber da noite. Posso dormir, porque é manhã em mim. E sinto a minha boca sorrir, deslocando levemente as pregas moles da fronha que me prende o rosto.
Posso deixar-me à vida, posso dormir, posso ignorar-me… E, através do sono novo que me escurece, ou lembro o galo que cantou, ou é ele, de veras, que canta segunda vez.

Bernardo Soares, O Livro do Desassossego

A simplicidade da luz interior

Há luz a mais. Sou ofuscado pelo brilho efémero do que me rodeia.
Preciso alimentar a ilusão de voltar ao eu… Magia possível sem efeitos especiais.

Johannes Vermeer - The Astronomer, cerca de 1668

Que é viajar, e para que serve viajar? Qualquer poente é o poente; não é mister ir vê-lo a Constantinopla. A sensação de libertação, que nasce das viagens? Posso tê-la, saindo de Lisboa até Benfica, e tê-la mais intensamente do que quem vá de Lisboa à China, porque se a libertação não está em mim, não está, para mim, em parte alguma. «Qualquer estrada», disse Carlyle, «até esta estrada de Entepfhul, te leva até ao fim do mundo.» Mas a estrada de Entepfhul, se for seguida toda, e até ao fim, volta a Entepfhul; de modo que o Entepfhul, onde já estávamos, é aquele mesmo fim do mundo que íamos a buscar.

Bernardo Soares, O Livro do Desassossego

Educação Sentimental

François Boucher - A Educação de Cupido, 1742

If you can keep your head when all about you
Are losing theirs and blaming it on you;
If you can trust yourself when all men doubt you
But make allowance for their doubting too;
If you can wait and not be tired by waiting,
Or, being lied about, don’t deal in lies,
Or, being hated, don’t give way to hating,
And yet don’t look too good, nor talk too wise;
If you can dream and not make dreams your master;
If you can think and not make thoughts your aim;
If you can meet with triumph and disaster
And treat those two imposters just the same;
If you can bear to hear the truth you’ve spoken
Twisted by knaves to make a trap for fools,
Or watch the things you gave your life to, broken
And stoop and build ’em up with worn-out tools;
If you can make one heap of all your winnings
And risk it on one turn of pitch-and-toss,
And lose, and start again at your beginnings
And never breathe a word about your loss;
If you can force your heart and nerve and sinew
To serve your turn long after they are gone,
And so hold on when there is nothing in you
Except the Will which says to them: “Hold on!”;
If you can talk with crowds and keep your virtue,
Or walk with kings nor lose the common touch;
If neither foes nor loving friends can hurt you;
If all men count with you, but none too much;
If you can fill the unforgiving minute
With sixty seconds’ worth of distance run
Yours is the Earth and everything that’s in it,
And which is more you’ll be a Man, my son!

O mesmo poema de Rudyard Kipling em português